Mandei
uma mensagem curtinha para minha irmã dizendo que eu estava acompanhada. Depois
desliguei o celular enquanto tomávamos sorvete sentados em um banco no calçadão
da praia. Eu me sentia no céu.
− Você
também se queimou – observei.
Nando
olhou para as suas mãos e comentou:
− Não
está me incomodando. De certa forma me acostumei a torrar no sol.
Isto eu
já sabia. Ele tinha sido surfista quando adolescente. Vi umas fotos dele no
Facebook, agarrado em uma prancha.
− Você
sempre vem para a praia? Quer dizer, férias, feriados, fim de semana...
− Eu
fui surfista – respondeu o Nando sorrindo para mim. – Quase me mudei para cá. E
então passei na faculdade e eu fui obrigado a estudar quando me dei conta que o
surf não me deixaria rico.
− Eu fiquei
muito tempo sem ver o mar.
Arrependi−me
imediatamente de ter feito aquele comentário. Depois que meu pai foi roubado
pelo meu tio, além de nos estabelecermos no interior, não tínhamos sequer
dinheiro para passar férias no litoral e nem em lugar nenhum.
− Por
quê?
E
agora? Tentei não mentir muito.
−
Porque meu pai passou por muitas dificuldades financeiras. Faz pouco tempo que
vim do interior. E ainda não tinha vindo para a praia. Resumindo, eu já nem
sabia mais o que era praia até ontem à tarde. Só lembrava o meu medo de onda.
− Seus
pais ficaram no interior?
Mais
perguntas. Ô criatura curiosa! Eu tinha medo daquilo.
−
Ficaram. Eu moro aqui com a minha irmã desde que passei na faculdade de Design.
Antes
que ele resolvesse investigar mais coisas sobre a minha vida, eu perguntei:
− E
você?
− O que
você quer saber?
− Quero
saber mais de você.
− Tipo
o quê?
− Tipo
onde você mora, onde trabalha...
Achei
que ele se importaria em contar. Mas pelo contrário. Nando decidiu abrir a sua
vida. Muitas coisas que ele falou obviamente eu já sabia. Meus tios ainda
moravam na mesma casa com o meu primo mais novo. O outro irmão do Nando, o mais
velho, morava com a namorada. Contou do trabalho no banco, do gosto pela
música, das viagens que fez. Em nenhum momento mencionou que tinha uma namorada.
Não
pude me conter.
− E sua
namorada?
O Nando
me olhou com uma cara meio estranha.
− Como?
−
Perguntei sobre a sua namorada. Em nenhum momento você falou nela.
O
comportamento dele mudou. Meio desconfortável ele respondeu:
− Ela
não é minha namorada. É minha noiva.
Fiquei
muda, engolindo o sorvete já sem vontade.
− Como
você sabe que tenho alguém?
− Não
sei de nada – menti. – Mas um homem como você dificilmente estaria sozinho.
Foi a
vez de ele ficar quieto. Após algum tempo remexendo no sorvete e olhando para
frente, Nando revelou subitamente:
− Eu
não ía ligar para você.
O
sorvete ficou atravessado na minha garganta. Não tive coragem de olhar para ele.
− Por
que ligou, então?
−
Porque vi você no centro.
Não
soube o que responder. Depois de uns dez segundos, o Nando continuou:
−
Resolvi me dar uma chance.
−
Chance para quê? – perguntei tensa.
− Eu
não amo minha noiva – ele respondeu depois de algum tempo.
Deixei
o ar sair lentamente dos meus pulmões. Será que aquela frase significava alguma
coisa a meu favor?
− Por
que está com ela? Por
conveniência?
Meu tom
de voz saiu meio seco. O Nando suspirou e respondeu:
− No
início até que eu gostava dela. Ela é uma mulher inteligente, bonita, mas…
muito superficial. Os pais dela são amigos dos meus. O sonho deles é que a
gente case, tenha filhos... Estou sendo pressionado a marcar a data do
casamento. Enfim, eu e a Raquel não temos nada a ver.
Data do
casamento. Horrível isto. Não contava com esta possibilidade.
− Bem –
falei, cautelosamente, – eu sempre acho que a gente deve ir em busca da própria
felicidade. Pelo menos é isto que eu faço diariamente.
De novo
o silêncio por parte dele. E meu sorvete estava com gosto de areia.
− Eu
vim para cá neste ano novo – contou o Nando, ainda mexendo no sorvete com a
colherinha – para tentar encontrar alguma saída.
−
Encontrou?
− Bom,
encontrei você.
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