segunda-feira, 30 de abril de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 14)


A semana que começou cheia de esperanças se transformou em um inferno por causa de todas as expectativas que criei. Segundo meu cunhado Guto, o Nando ligou para sondar o terreno. Se eu mostrasse que ainda estava a fim de ficar com ele – e isto eu fiz, abertamente – então certamente ele me ligaria de novo. Era só aguardar.
E eu aguardei. Suportei bem até quarta-feira. Era o máximo que minha cabeça ansiosa de mulher tinha condições de agüentar. Se o Nando estivesse mesmo com vontade de sair comigo, então ele ligaria em poucos dias.
A quinta-feira amanheceu sem que o Nando tivesse me ligado. E para mim isto significou que ele não estava mais interessado em mim. Com um mau humor do cão, passei o dia tentando não pensar nele, desejando ardentemente que as aulas começassem para que eu pudesse desviar minha mente para algo que não me atormentasse. Até minha chefe notou que eu estava em crise e menti que era culpa da minha TPM. Nunca tive TPM na minha vida. A Rafa também tentou me acalmar quando eu revelei o motivo da minha ira. Enfim, nem eu me suportava mais. O Facebook dele estava virado em mensagens dos amigos, da noiva, do bispo. Jurei para mim mesma que nunca mais iria escarafunchar no Facebook do Nando. Meu juramento durava mais ou menos quinze minutos.
Sábado à noite a Rafa e o Guto decidiram que iam para a balada. Fui convidada, mas recusei. Tinha medo de encontrar o Nando em algum lugar – acompanhado – e não saber lidar com isso. Era melhor que eu ficasse em casa curtindo a minha dor.
Peguei um DVD na locadora e cozinhei brigadeiro na panela. Sentei-me para ver a comédia que loquei para tentar dar alguma risada. O filme era ótimo, mas eu comecei a chorar na primeira cena. Nem senti o gosto do chocolate. Minha impressão era que a pessoa mais solitária do mundo era eu. Quando a solidão se tornou insuportável, resolvi ligar para minha mãe.
Meu pai atendeu, falando baixinho. Sim, ela estava dormindo. Não queria que ele percebesse minha voz de choro. Menti que tudo estava bem, o estágio ía às mil maravilhas e que enfim minha vida não podia estar melhor. Combinei que passaria um final de semana lá no interior e quando desliguei minhas lágrimas escorriam ainda pelo rosto.
Dois minutos depois o celular vibrou de novo. Era minha mãe, só podia ser ela. Ela tinha acordado.
- Oi, mãe.
Minha voz era a expressão do desanimo. Com certeza ela se daria conta que sua filha estava quase enfiando a cabeça dentro de um forno.
- Posso ligar depois...
Meu Deus, era ele. Enxuguei imediatamente as minhas lágrimas como se o Nando pudesse visualizar meu rosto choroso.
- Não! Não desligue. Ela não vai me ligar mais.
- É que eu pensei…
- Falei com meu pai agora – expliquei rapidamente, ainda tensa com a possibilidade de ele desligar – e como minha mãe estava dormindo, achei que ela tivesse acordado e retornando a ligação.
Fiquei sem fôlego.
- Pelo visto você está em casa...
- Estou, sim. Minha irmã me convidou para sair mas eu não quis.
- Por quê?
- Porque não sou muito de badalar, você sabe.
Fiz uma pausa e perguntei, meio sem querer saber a resposta:
- E você? Está onde?
- Em casa. Acho que peguei um resfriado.
- Você… você está sozinho?
- Estou, sim. Por quê?
- Nada. Só quis saber.
Bingo! A bruxa não estava com ele.
- Achei sua voz diferente quando atendeu o celular.
Putz, a minha maldita voz de choro.
- É mesmo? Impressão sua.
- E então? Me conte as novidades. Estou atrapalhando você?
- Claro que não. Eu peguei um DVD de comédia para assistir, mas não me agradei muito. Até foi bom você me ligar. Assim eu me distraio um pouco.
- Eu gosto de conversar com você.
Fui até o céu e voltei. Ele tornou a dizer:
- Você me diverte. Acho que já disse isso uma vez.
- Quase isto. Me parece que você disse que eu era engraçada.
- Deve ter sido. Dá praticamente na mesma. Mas então me diga. O que você anda fazendo?
“Chorando por sua causa.”
- Ora, o de sempre. Por enquanto, só indo ao estágio. No entanto… estou pensando em largar tudo.
Era a primeira vez que eu dizia aquilo, inclusive para mim mesma. Não queria admitir que eu estava odiando meu curso de Design. A comoção familiar seria grande quando a verdade se revelasse. Isto é, caso eu tivesse coragem de chutar o balde.
- Largar tudo? Tudo o quê?
Nossa, eu falei muito sobre a minha insatisfação acadêmica. E só. Sobre a minha família, nem pensar. E ele tentou me ajudar do jeito que podia. Ficamos mais de uma hora no telefone. E eu acho que a conversa iria por mais tempo se não fosse o irmão dele ter chegado. O Nando ficou de me ligar outro dia e quando eu dormi, sonhei a noite inteira com ele.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 13)

O feriadão terminou e eu voltei para casa e a minha rotina. Como faltava um mês para as aulas começarem, minha vida era apenas ir ao estágio. E pensar no Nando. Eu passava muito tempo sozinha. A Rafa estava sempre em função do Guto. As meninas ficaram na praia e eu sem ninguém. Monitorar a vida do Nando era uma frustração. Eu só via convites para festas, mensagens da Raquel, ou seja, tudo na mesma. Da parte dele, silêncio total em relação a mim. Isto me deixou muito triste e abatida. A primeira a reparar que eu estava emagrecendo foi, é claro, minha irmã. Levei um sermão de uma hora inteira, na presença do Guto, no qual Rafaela praticamente me mandou que eu esquecesse o Fernando. Nem respondi. Escutei as palavras duras da Rafa completamente muda, sabendo que ela estava certa, mas sem querer admitir em abandonar um sonho e um amor acalentado por tantos anos. Ela só parou de falar quando uma amiga ligou. Aproveitando que minha irmã tinha se afastado para conversar, Guto se voltou para mim e disse simplesmente:

− Não se preocupe.
*
Era um entardecer de domingo, monótono, quente e chato. Eu estava sozinha em casa. Não tinha vontade de ler, ouvir música e muito menos ficar no computador. De repente, me deu vontade de pegar um ônibus e ir para a casa dos meus pais. E eu teria feito isto, se não fosse pelo meu estágio.

O celular tocou. Devia ser minha mãe. Ela tinha dito que iria me ligar mais ou menos por àquela hora.

− Oi, mãe – fui falando sem sequer confirmar no visor se era ela mesma.
− Pela sua voz acho que você não está a fim de falar com a sua mãe.

Endireitei−me no sofá com o coração saltando pela boca. Quase gaguejei:

− Nando? É você?
− Claro que sou eu – ele riu do outro lado. – Você queria que fosse sua mãe?
− Não! – respondi, para depois tentar consertar. – Quer dizer, não esperava que você fosse me ligar.
− Eu prometi, lembra?

O domingo de repente se tornou algo fantástico. A vida também.

− Prometeu naquele dia... Muitas coisas podem ter acontecido de lá para cá.

Percebi que ele ficou mudo por alguns segundos para depois dizer, cauteloso:

− É… não aconteceram tantas coisas assim. Não ainda.

Eu sabia a que ele estava se referindo, mas mudei estrategicamente de assunto. E também não estava nem um pouco com vontade de falar sobre a Raquel.

− Como foi sua viagem?
− Foi um saco, mas pelo menos resolvi tudo. Fiquei uns cinco dias por lá. E você como está?
− Na mesma – quase respondi que minha vida era somente esperar por ele. – Estou de férias da faculdade. A única coisa que faço é ir para o estágio e voltar.
− Isto que é vida mansa.
− Você que pensa.
− E suas queimaduras?
− Não incomodam mais – Oba, ele estava preocupado comigo. Ou sendo só gentil? – Me cuidei um pouco, evitei o sol, mas a pele ainda está descascando.
− Não entrou mais no mar?
− Só até o tornozelo.
− Pensei que tivesse perdido o medo.
− Não tive bons motivos para entrar no mar de novo.

Ele riu e eu me descobri cada vez mais apaixonada por aquela risada.

− Bem, eu só liguei para ver como você estava.

Já?, pensei eu não muito feliz. Eu achei que ele iria me convidar para alguma coisa...

− Estou muito bem – respondi com a voz firme, tentando não demonstrar a minha decepção.
− Vou jogar futebol com meus amigos – explicou ele como se tivesse sentido pelo tom da voz toda a minha frustração.
− Que ótimo... Cuidado para não se machucar, então.

Tentei mostrar que estava super feliz por ele preferir jogar futebol a ficar comigo. Não havia problema nenhum em ele ir bater uma bolinha e beber depois. Afinal, QUAL É O PROBLEMA? Nenhum.

− Certo, vou me cuidar sim. Você também se cuide.
− Pode deixar.
− Nos falamos, então.
− Falamos, sim.
− Beijos.
− Beijos.

Desliguei o celular sem saber se ria ou chorava. Se era para fazer alguma opção, então preferi ficar feliz. Bom, ele havia entrado em contato, não é mesmo? Quem sabe um dia o Nando ligasse para me convidar para alguma coisa, nem que fosse para comer um picolé...



terça-feira, 24 de abril de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 12)


Como eu suspeitava o Guto praticamente se mudou para o nosso apartamento. Mesmo passando as férias na sua bela cobertura, na companhia dos pais e com toda a mordomia que poderia desfrutar, o namorado da Rafa pareceu se adaptar bem a nossa bagunça e gritaria. O quarto ficou só para mim. Rafa, para não deixar o amado dormir sozinho no sofá da sala, resolveu levar o colchão para lá. Por fim, acabei me acostumando com aquele rapaz esquisito, que em alguns momentos parecia ter talento para a comédia e em outras vezes ficava em um silêncio de doer. Minha irmã falava por ele. O cara não parecia se importar com as loucuras da Rafa e suportava bem todo o nosso papo feminino. Algumas vezes ele ousou dar seu palpite sobre minha relação – ou seja lá o que fosse – com o Nando. Felizmente era sempre a meu favor. Guto achava que a gente ía se casar. Dizia que podia ver o futuro em algumas situações e o meu estava claramente definido. Evidentemente que a minha irmã debochava das supostas previsões dele. Eu não. Quando eu flagrava Guto me encarando e já habituada com o jeitão do meu cunhado e sem mais vergonha nenhuma de falar sobre todo e qualquer assunto na frente dele, perguntava:

− O que você está enxergando?
− Só coisas boas – ele respondia sempre.
− Se você visualizar alguma coisa ruim... Vai me dizer? – perguntei certa vez.
− Claro.
− Então tá.

Assim foi minha temporada de dez dias na praia. De espera e tensão. Eu precisava urgente de um celular novo que tivesse internet. Precisava de grana também para comprar um. Apenas uma vez tive oportunidade de ir a uma lan house. Eu, Rafa e Guto e mais as meninas não nos desgrudávamos nunca. Bem que eu tentei me desvencilhar deles várias vezes para correr até um computador e futricar no Facebook do Nando. Quando a ocasião surgiu, não pensei duas vezes. Era um início de tarde ensolarado. Com as mãos trêmulas, digitei meu login e logo estava na página do Nando.

Fiquei frustrada e triste. Pelos recados, eu percebi que ele já havia voltado de São Paulo. E ainda estava noivo, com direito a recadinho dela, aquela desgraçada. Não fiquei nem dois minutos na lan. Saí com vontade de chutar a primeira lata de lixo que vi pela frente. Para espairecer e não ter que topar com a cara da Rafa (ela logo saberia por que eu estava com aquela cara de bunda), fui caminhar sozinha no calçadão. Somente não chorei pelo simples motivo que havia pessoas a minha volta. Fiquei firme, segurando as lágrimas. Por que ele não tinha me ligado?

Um toque no meu celular indicou que uma mensagem havia chegado. Devia ser a Rafa, especulando saber por onde eu tinha me enfiado. De mau humor, peguei o celular na minha bolsa. Para meu espanto, não era a Rafa. E eu não conhecia aquele número. Só podia ser engano.

“Torrando muito no sol? Beijos, Nando”.

Minhas pernas tremeram significativamente e todas as esperanças perdidas voltaram. Sentei no primeiro banquinho que encontrei para me acalmar, sem parar de olhar para a mensagem dele. Glória total. O Nando tinha se lembrado de mim, chegando a se prestar a me mandar uma mensagem! Agradeci aos céus emocionada. Mas não pude curtir muito aquele momento de alegria. De repente ouvi a voz de Rafaela berrando:

− Ela está lá! Ei, Paulinha!

Olhei para a minha direita e vi toda a turma me acenando. Não consegui ficar sem dividir minha felicidade. Levantei e me aproximei deles empolgada.

− Adivinhem quem me mandou uma mensagem?

As meninas festejaram e Guto chegou a comentar:

− Eu não disse?

A Rafa perguntou:

− E o que você respondeu?
− Nada, ainda – confessei. – Fiquei tão nervosa que nem pensei em alguma coisa espirituosa.
− Diga que você está morrendo de tesão – sugeriu minha irmã, rindo da cara de espanto que eu fiz.
− Com isto eu o afastaria na mesma hora – respondi.
− Ela tem razão – concordou Guto. – Mande beijos para ele e está bom assim, mesmo eu não sabendo o que ele escreveu para você.
− Perguntou se eu estava torrando muito no sol.

Para variar, Rafaela esculhambou:

− Que mensagenzinha sem graça.

− Mas eu gostei. Ele se lembrou de mim. Podia simplesmente não ter enviado mensagem nenhuma.

Meu celular tocou e todos ficamos em silêncio. Será? Será?

Voltei para a realidade. Era minha mãe.


                                    

sábado, 21 de abril de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 11)


Abri a porta do apartamento e me surpreendi quando encontrei movimento em casa apesar de ser ainda cedo. Ouvi a voz de Rafa na cozinha e fui até lá. Para minha surpresa, deparei–me com um rapaz sentando junto à mesa saboreando um pedaço de pão. O rosto dele não me era estranho.

– Bom dia – cumprimentei sem entender nada. Minha irmã estava em frente ao fogão, esperando o leite ferver.
– Bom dia – respondeu o cara.
– Oi, Paulinha – retrucou por sua vez minha irmã com a expressão contente. – Este é o Guto. Lembra dele?
– Oi, Guto – disse eu mecanicamente, me sentindo pouco a vontade pelo fato de minha irmã ter posto um homem dentro de um apartamento que só tinha mulheres. – Não me lembro de você.
– Da faculdade – esclareceu Guto tentando ser simpático. – Curso Ciências da Computação.

Estava explicada a cara de nerd. Ele simplesmente não tinha nada a ver com a louca da Rafaela.

– Ah… Acho que já nos cruzamos por lá.

Eu tentava situá–lo em algum ponto da minha mente. Mas eu só pensava no Nando.

– Várias vezes – confirmou meu novo cunhado.

Servindo Guto de leite, Rafa perguntou curiosa:

– E então? A noite rendeu?
– Muito – eu era só sorrisos.
– Foi com aquele cara? O do reveillon?
– Sim, graças a Deus.

Abri a geladeira e fui me servir de suco. Sem me dar chance para respirar, Rafa foi em frente:

– E cadê ele?
– Foi para casa. Ele tem que viajar hoje à noite para São Paulo.
– Puxa, que azar – comentou Guto.

Rafaela sentou ao lado do namorado e perguntou:

– Em pleno feriadão?

Eu não estava gostando muito daquele interrogatório. E muito menos do tal do Guto estar ficando por dentro da minha vida amorosa.

– Ele é advogado de um banco. Há um problema a ser resolvido na matriz e o diretor o escalou para resolver.
– E quando ele volta?
– Acho que daqui a uma semana – disse bebendo o suco devagarzinho, só pensando nele.
– E este tal de Nando vai te ligar?

Lembrei-me da noiva ou quase ex–noiva e respondi:

– Disse que vai.
– E você acreditou?

Era duro de aguentar a expressão de descrédito da Rafa.

– Acreditei.
– Pois eu não acreditaria.
– Ele disse de livre e espontânea vontade que me ligaria. Não fui eu que pedi.

Minha voz saiu tão dura e seca que os dois me encararam surpresos e não falaram mais nada. Bebi o resto do suco quase de um gole só e saí da cozinha, pisando duro. Entrei no meu quarto imaginando se agora teria que dividir minha cama com o Guto também. Só quando me atirei no colchão é que me dei conta do quanto estava cansada. Dormi em menos de dez segundos e Nando foi meu último pensamento. E o primeiro quando me acordei, horas depois.


quinta-feira, 19 de abril de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 10)


Cheguei a levar um choque. Encarei−o e me deparei com aquele sorriso que eu já tinha aprendido a amar. Senti meu rosto arder, mais do que já estava ardido.

− Espero que eu possa ser de alguma ajuda para você.

Ele se inclinou e me beijou. Fiquei emocionada. Pelos olhos dele percebi que o Nando já gostava um pouco de mim e isto não era ilusão alguma da minha parte.

− E você decidiu o que pretende fazer?

 Nando suspirou de novo e pegou a minha mão.

− Ser feliz.

Quase explodi de felicidade de novo. O Nando estaria querendo dizer que desejava ser feliz comigo? Se fosse isto mesmo, eu era a mulher mais realizada do mundo e ainda estávamos em primeiro de janeiro. O meu novo ano prometia ser tudo de bom.

Não resisti e me colei nele, pouco me importando com a ardência da minha pele. A princípio ele ficou meio temeroso de me machucar. Chegou mesmo a dizer:

− Sinto sua pele ainda quente...
− Não me importo – murmurei aconchegada a ele e logo sentindo os seus braços me envolverem. – Isto não é o mais importante agora.

Ficamos um tempão ali, aos beijos, abraços ou simplesmente de mãos dadas. A madrugada se passou e o sol nasceu ante os nossos olhos. A felicidade era algo palpável para mim. Nunca a tinha sentido tão próxima. Tudo o que Nando dizia, eu ria. E ele ria da minha risada, realmente parecendo satisfeito de estar comigo. Será que a tal da Raquel nunca o fizera feliz? Eles nunca riam juntos?

Eram mais ou menos sete horas da manhã quando decidimos ir embora. Eu estava louca de sono, mas se ele me convidasse para ficar o dia inteiro ali na praia, teria ficado evidentemente. Porém, para o meu desalento, enquanto meu primo me levava de volta para casa, anunciou:

− Tenho que voltar hoje.

Olhei−o, espantada. Aquilo tinha sido um choque. Eu já imaginava que ficaria com ele durante pelo menos uma semana.

− Já? Você não vai ficar todo o feriadão aqui comigo? Quer dizer, na praia?
− Recebi uma ligação do meu diretor. Vou ter que viajar para São Paulo hoje à noite. Temos alguns problemas jurídicos na matriz e eu fui escalado para ir resolver.

Fiquei muda. Mais da metade da minha alegria tinha se esvaído.

− Você queria que eu ficasse? – ele perguntou subitamente.

Que vergonha. E agora? O que eu vou responder?

− Claro que sim. A gente se deu tão bem… acho que vou sentir sua falta.

Eu temia que ele me achasse um grude. Imagine. Mal fazia 24 horas que havíamos nos conhecido e eu já estava praticamente me declarando para o Nando.

− Acha que vai sentir minha falta? Não tem certeza ainda?
− Claro que vou sentir – confessei olhando direto para frente, segurando com força a mão dele. – É uma pena que eu não possa dar um tiro no seu chefe.

Ele riu, a gargalhada cristalina que eu adorava.

− Você é engraçada.

Encarei−o, admirada com o que ele tinha dito. Será que era um elogio?

− Engraçada? Você me acha engraçada?

Foi a vez de o Nando me olhar, surpreso com a minha reação.

− Qual é o problema? Se você fosse uma mulher insossa, eu não teria passado uma noite em claro na sua companhia.

Ponto para mim.

− Achei que você estava me chamando de palhaça.
− De jeito nenhum – ele riu de novo. Passados alguns minutos, Nando confessou – Você me faz rir. Eu gosto disso. Já fazia um tempão que eu não achava graça de nada.

Quase chorei. Não esperava que ele fosse capaz de dizer uma coisa destas justo para mim, uma completa desconhecida. Tentei fazer com que a minha voz não tremesse quando respondi:

− Se eu faço você rir é porque me sinto bem ao seu lado. E eu… bem, é uma pena que você não poderá ficar mais tempo aqui comigo.

Estávamos perto do meu prédio e uma tristeza se abateu sobre mim. Ele pareceu notar, pois me fez parar de repente e me deu um longo abraço. Ficamos algum tempo assim, sem dizer nada. Porém, passados alguns momentos, tivemos que nos desgrudar. Ele me encarou e eu notei que havia carinho em seus olhos.

− Cuide−se – disse ele.

Eu queria ansiosamente que o Nando dissesse mais coisas que além de um simples “cuide−se”. Parecia quase uma despedida eterna.

− E o que você vai fazer?
− Vou viajar.
− Não é isto que estou querendo saber – tomei coragem, respirei fundo e perguntei – Você vai manter o noivado ou não?

Ele sorriu, meio triste. Achei que não fosse responder, até.

− Depois que eu voltar da viagem terei uma séria conversa com ela.

Consegui segurar um suspiro de alívio em tempo. E será que se o Nando brigasse com a noiva, ele ficaria comigo?

Minha pergunta ficou sem resposta. Nando consultou o relógio e disse:

− Vou dormir até o meio dia, depois vou pegar o carro e ir para casa arrumar minhas coisas.
− Que horas você embarca?
− Às 19 horas. Creio que vou ficar uma semana por lá.
− Tudo bem – disse eu sentindo o coração apertado. – Espero que você faça uma ótima viagem.
− Obrigado.

Ele se inclinou e me beijou docemente. Sim, era uma despedida. Ele romperia o noivado, mas não tinha dito que ficaria comigo. Ficaria com quem, então? Haveria alguma outra na jogada além de mim?

− Eu vou ligar para você.
Nossa! Meus olhos devem ter brilhado quando ele disse isto. Fiquei meio sem voz de tão surpresa.

− Vou ficar esperando.
− Vou ligar para você – ele repetiu dando−me mais um beijo.

Depois disso o Nando se virou e foi embora. Eu fiquei na calçada, repetindo a cena do dia anterior, observando−o se afastar desta vez mais apressado. Porém, antes de chegar à esquina, meu amor se voltou como para se certificar de que eu ainda estava ali, feito uma estátua apaixonada a cuidar cada passo seu. Para minha surpresa, ele me atirou um beijo e em seguida dobrou na rua seguinte, sem sequer me dar tempo de retribuir o carinho. De qualquer forma, aquele simples gesto me deixou feliz. E cantando, cheguei em casa.


terça-feira, 17 de abril de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 9)



Mandei uma mensagem curtinha para minha irmã dizendo que eu estava acompanhada. Depois desliguei o celular enquanto tomávamos sorvete sentados em um banco no calçadão da praia. Eu me sentia no céu.

− Você também se queimou – observei.

Nando olhou para as suas mãos e comentou:

− Não está me incomodando. De certa forma me acostumei a torrar no sol.

Isto eu já sabia. Ele tinha sido surfista quando adolescente. Vi umas fotos dele no Facebook, agarrado em uma prancha.

− Você sempre vem para a praia? Quer dizer, férias, feriados, fim de semana...
− Eu fui surfista – respondeu o Nando sorrindo para mim. – Quase me mudei para cá. E então passei na faculdade e eu fui obrigado a estudar quando me dei conta que o surf não me deixaria rico.
− Eu fiquei muito tempo sem ver o mar.

Arrependi−me imediatamente de ter feito aquele comentário. Depois que meu pai foi roubado pelo meu tio, além de nos estabelecermos no interior, não tínhamos sequer dinheiro para passar férias no litoral e nem em lugar nenhum.

− Por quê?

 E agora? Tentei não mentir muito.

− Porque meu pai passou por muitas dificuldades financeiras. Faz pouco tempo que vim do interior. E ainda não tinha vindo para a praia. Resumindo, eu já nem sabia mais o que era praia até ontem à tarde. Só lembrava o meu medo de onda.
− Seus pais ficaram no interior?

Mais perguntas. Ô criatura curiosa! Eu tinha medo daquilo.

− Ficaram. Eu moro aqui com a minha irmã desde que passei na faculdade de Design.

Antes que ele resolvesse investigar mais coisas sobre a minha vida, eu perguntei:

− E você?
− O que você quer saber?
− Quero saber mais de você.
− Tipo o quê? 
− Tipo onde você mora, onde trabalha...

Achei que ele se importaria em contar. Mas pelo contrário. Nando decidiu abrir a sua vida. Muitas coisas que ele falou obviamente eu já sabia. Meus tios ainda moravam na mesma casa com o meu primo mais novo. O outro irmão do Nando, o mais velho, morava com a namorada. Contou do trabalho no banco, do gosto pela música, das viagens que fez. Em nenhum momento mencionou que tinha uma namorada.

Não pude me conter.

− E sua namorada?

O Nando me olhou com uma cara meio estranha.

− Como?
− Perguntei sobre a sua namorada. Em nenhum momento você falou nela.

O comportamento dele mudou. Meio desconfortável ele respondeu:

− Ela não é minha namorada. É minha noiva.

Fiquei muda, engolindo o sorvete já sem vontade.

− Como você sabe que tenho alguém?
− Não sei de nada – menti. – Mas um homem como você dificilmente estaria sozinho.

Foi a vez de ele ficar quieto. Após algum tempo remexendo no sorvete e olhando para frente, Nando revelou subitamente:

− Eu não ía ligar para você.

O sorvete ficou atravessado na minha garganta. Não tive coragem de olhar para ele.

− Por que ligou, então?
− Porque vi você no centro.

Não soube o que responder. Depois de uns dez segundos, o Nando continuou:

− Resolvi me dar uma chance.
− Chance para quê? – perguntei tensa.
− Eu não amo minha noiva – ele respondeu depois de algum tempo.

Deixei o ar sair lentamente dos meus pulmões. Será que aquela frase significava alguma coisa a meu favor?

− Por que está com ela? Por conveniência?         

Meu tom de voz saiu meio seco. O Nando suspirou e respondeu:

− No início até que eu gostava dela. Ela é uma mulher inteligente, bonita, mas… muito superficial. Os pais dela são amigos dos meus. O sonho deles é que a gente case, tenha filhos... Estou sendo pressionado a marcar a data do casamento. Enfim, eu e a Raquel não temos nada a ver.

Data do casamento. Horrível isto. Não contava com esta possibilidade.

− Bem – falei, cautelosamente, – eu sempre acho que a gente deve ir em busca da própria felicidade. Pelo menos é isto que eu faço diariamente.

De novo o silêncio por parte dele. E meu sorvete estava com gosto de areia.

− Eu vim para cá neste ano novo – contou o Nando, ainda mexendo no sorvete com a colherinha – para tentar encontrar alguma saída.
− Encontrou?
− Bom, encontrei você.