sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

ASSOMBRAÇÃO NA ESTRADA


          Meu nome é Milton, tenho 40 anos de vida e mais da metade dela só de estrada. Explico: sou caminhoneiro. Herdei a profissão do meu falecido pai. Comecei na boléia aos 15, peguei no volante aos 18 e nunca mais larguei esta vida. No início, antes de eu casar, tudo era festa. Agora, com mulher e filhos, fica cada vez mais complicado andar por estar estradas, sujeito a assaltos e outras coisas mais. Se vê cada coisa estranha.…E o que vou contar agora para vocês é algo muito, mas muito estranho mesmo. 
  Aconteceu há mais ou menos um ano. Fiquei parado seis meses devido a um rompimento nos tendões, resultado de uma partida de futebol. Foram seis meses que se não fosse minha mulher pôr comida dentro de casa, passaríamos fome. Bem, finalmente fui liberado para pegar a estrada. Confesso que estava com um pouco de saudade. Tinha perdido contato com meus amigos caminhoneiros. A gente sente falta das conversas, das risadas, dos causos. A minha primeira viagem de retorno era pra longe. Mas eu não tinha escolha, né? Peguei minha carga e botei os pés na estrada.
 Tudo transcorreu bem na primeira noite. Encontrei alguns amigos e dormi em um posto de gasolina. No dia seguinte, nada aconteceu de anormal. O caminhão estava legal, o dia bonito e as estradas daquele jeito que todo mundo sabe. Lá pelas nove horas da noite me bateu fome. E cansaço também. Parei em um posto de beira de estrada, humilde. Não havia nenhum outro caminhão. Pedi um sanduíche e um refrigerante e fiquei ali, comendo sozinho, lembrando que uns cinqüenta quilômetros adiante havia um posto maior, onde eu poderia dormir com mais segurança e, certamente, haveria outros colegas para pôr os causos em dia. Quando eu já estava mordendo meu último pedaço de sanduíche, alguém apareceu na minha frente e se sentou, sem pedir licença. 
 Levei um susto. O restaurante estava praticamente vazio. Somente eu e o proprietário, um senhor sonolento que escutava um radinho, no caixa. Para minha surpresa, eu conhecia a pessoa que sentou ali comigo. Era a Susana, irmã do meu amigo e colega, Roberto.
- Susana! Puxa, você me deu um susto! Como você está? Já casou?
 Eu estava realmente satisfeito em ver Susana. Aquela moça deveria ter uns 20 anos. Eu a tinha visto nascer e crescer. Sempre fôra muito bonita. Mas naquela noite, ela estava estranha. Os cabelos caiam soltos pelo vestido branco e ela não mostrava seu habitual sorriso.
- Quero que você me faça um favor – pediu ela, com a voz profunda.
 Fiquei cabreiro. Aquela voz… Nem parecia ela. Reparei que havia um ferimento no seu pescoço, disfarçado pelos cabelos compridos. Respondi, meio sem jeito:
- Claro. O que você quiser… Está sozinha?
- Toma – disse ela, estendendo-me alguma coisa e sem responder minha pergunta – Leve para o Roberto e diga para ele entregar para o André.
 Nas minhas mãos foi depositado um belo crucifixo de prata, com pedrinhas brilhantes. Lembrei que André era o noivo de Susana.  Olhei de novo para a moça, que me fitava intensamente. Eu teria que desviar o caminho, isto atrasaria minha viagem, mas eu não consegui recusar o pedido feito por aqueles olhos negros e tristes. Sim, os olhos dela estavam muito tristes.
- Sim, está bem. Você espera um pouco? – pedi eu – Vou pagar a conta.
 Levantei e fui até o caixa me acertar. Tudo correu bem rápido, mas quando eu me virei para ir ao encontro de Susana novamente, ela havia ido embora. Fiquei chateado. Saí correndo até o lado de fora do restaurante para tentar alcançá-la, mas não havia sequer um sinal que fosse da menina. Bem, Roberto talvez pudesse me explicar alguma coisa. Entrei no caminhão, ainda intrigado, dirigi mais alguns quilômetros e encontrei o posto onde dormi até às seis horas da manhã. E de novo peguei a estrada, com o crucifixo de Susana brilhando no espelho interno do caminhão.
 Próximo ao meio-dia, cheguei na casa de Roberto, depois de desviar por uma estrada que aumentou meu trajeto em 30 quilômetros. Felizmente, meu amigo estava em casa. A esposa havia ganho bebê e ele estava dando uma força. Roberto ficou feliz ao me ver. Ele me convidou para entrar, mas eu recusei para não atrasar mais. Depois de conversamos algumas amenidades, resolvi ir direto ao assunto:
- Roberto, na verdade vim até aqui para lhe entregar isto – e tirei do bolso o crucifixo.
 Quando meu amigo se deparou com a jóia, ficou muito pálido. Segurando-o firmemente, ele me perguntou:
-É de Susana! Onde você conseguiu isto?
 Não sei o motivo, mas eu comecei a ficar nervoso.
- Com a própria Susana. Ontem eu parei em um posto pequeno na beira da estrada e quando estava no final do meu lanche, ela apareceu e pediu que eu lhe entregasse isto. E que você levasse o crucifixo até o André. É o noivo dela, não é? Eles romperam?
Roberto estava tão branco que pensei que fosse desmaiar. E minhas mãos começaram a suar.
- Milton… - ele respirou fundo – Meu cunhado deu de presente este crucifixo para Susana. Uma semana antes do casamento, dois rapazes a assaltaram e arrancaram a correntinha do pescoço da minha irmã. O ferimento foi tão grande que ela morreu de tanto sangrar.
Aí quem quase teve um troço fui eu. Não era possível. Eu fiquei apavorado. Cheguei a estontear. 
- Mas era… era ela – tentei dizer.
- Você tem certeza? – Roberto tremia com o crucifixo entre os dedos.
- Claro, claro que sim! Ela sentou a minha frente! Fiz perguntas que ela não respondeu! E reparei que Susana tinha um ferimento no pescoço e que disfarçava com os cabelos. 
- Como estava vestida?
- De branco – respondi, sentindo-me enjoado.
- Ela foi enterrada de branco…
Fiquei em pânico. Despedi-me rapidamente do meu amigo e entrei no caminhão. Não sei como consegui dirigir aquele dia e nos outros. Quando anoitecia, eu me refugiava em postos onde havia bastantes caminhoneiros. Eu me recusava a ficar sozinho. Não tive coragem de contar esta história para ninguém, a não ser para minha mulher que, felizmente, não disse que eu estava ficando louco. Um dia destes, uma moça de branco e cabelos compridos entrou no restaurante em que eu estava com outros colegas, à noite. Levei um susto, quase me engasguei. Mas não era Susana. Aquela moça estava bem viva e feliz. E no seu pescoço brilhava um lindo crucifixo de pedras brilhantes.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

UM ZUMBI NO MEU PÁTIO


         Ela apontou a arma. Era para ser uma brincadeira, de mau gosto, é verdade. Rogério não deu bola. Continuou segurando sua latinha de cerveja, com os olhos grudados na TV. Resumiu-se a perguntar:
- Larissa, não tem louça na pia?
          O estampido soou forte e Larissa só se deu conta que tinha matado seu marido quando ele desabou para a frente, com um buraco do lado da cabeça. A cachorrada latiu, a televisão não alterou sua programação por causa do Rogério e Larissa disse para si mesma: estou encrencada. Não que amasse o Rogério. Longe disso. Só estava com ele para não passar fome. Mas... ser presa por assassinar aquele inútil nem pensar.
           Rápida, Larissa pôs a arma sobre a mesa e foi em direção ao corpo inerte. Sim, o desgraçado estava morto. Tentando se controlar, ela pegou um cobertor grosso, enrolou o falecido junto com o revólver e o arrastou até o pátio. Felizmente era noite. Não havia uma única estrela no céu para iluminar seu crime. Larissa, apavorada, escavou da melhor maneira que pôde uma cova para enterrar o defunto. Depois do que considerou estar razoavelmente fundo, empurrou-o para dentro do buraco, jogando terra por cima.
          A pior parte veio depois. Limpar a sujeira. Munida de todo o tipo de material de limpeza que dispunha e luvas, Larissa procurou dar um jeito de acabar com todas as provas. Quando pensava que tinha dado conta, encontrava resquícios de sangue em um canto. Seu tormento levou uma madrugada inteira. O sol raiou e encontrou Larissa pondo suas roupas dentro de duas sacolas. Não teve tempo de sentir culpa. Saiu para sempre daquela casa maldita e na vila ninguém soube dizer aonde haviam ido parar a Larissa e o Rogério. E quem se importava com eles?

          Quando a Valentina foi morar naquela simpática casinha, esperava ali recomeçar sua vida. Fazia pouco mais de um mês que resolvera tentar a vida na cidade grande e estava morando junto com uma prima. Descobriu que uma vizinha da vila precisava urgentemente alugar uma casa, pertinho de onde estava. 
         Valentina logo gostou da casa. Era pequena, simples e alguma coisa confortável. Tinha um banheiro decente e uma cozinha ajeitada. O aluguel era baixo, dava para pagar com as suas faxinas. A única coisa que estranhou foi o cheiro.
       Nunca disse nada para a proprietária, mas a primeira coisa que sentiu quando botou os pés na casa foi o tal cheiro. Ele estava impregnado por tudo, inclusive no pátio. Não que fosse forte, mas era persistente. As janelas abertas não eram suficientes para eliminá-lo e Valentina terminou por se resignar. No fim das contas, terminou se acostumando e nem o sentia mais.
         Os fatos estranhos começaram a acontecer duas semanas depois de instalada na sua nova moradia. Valentina passou a escutar gemidos vindo dos fundos da casa. Uma ninhada de gatinhos? Ao abrir a porta que dava para o pátio, os gemidos silenciaram. Ela chegou a achar que havia escutado mal e ficou por isto mesmo.
          A partir disto, todas as noites gemidos e lamentos invadiam a casa de Valentina, tirando seu sono e sossego. Atemorizada, a mulher chamou alguns vizinhos, porém estes não escutaram absolutamente nada. A sensação de insegurança aumentou. Mesmo assim, Valentina se recusou a deixar a casa. Talvez fosse mesmo impressão sua.
      Naquela noite chuvosa, Valentina se preparava para tomar um chá antes de dormir. Até então, o único som que escutava era das gotas da chuva batendo no telhado. Sua calmaria durou pouco. Um relâmpago, seguido de um clarão, iluminou a porta dos fundos no exato momento em que Valentina escutou lamentos mais altos e mais sofridos vindos do pátio. O susto foi grande, mas ela já estava com raiva daquilo tudo. E se fossem alguns moleques querendo lhe pregar uma peça?
     Furiosa e armada de uma faca, Valentina escancarou a porta, pouco se importando com a chuva. Seus olhos perscrutaram a escuridão e algo lhe chamou a atenção. A terra do pátio, próximo ao muro, estava revirada. Aquilo a intrigou. Mesmo se molhando, Valentina foi até o local e se deparou com uma... cova aberta! Imediatamente, ela deu uma volta em torno de si mesma, em pânico. Algo estava muito, muito errado. 
          A porta bateu violentamente, deixando-a do lado de fora. Valentina largou a faca no chão e se jogou contra a porta, pensando que ela estivesse trancada. Mas ela a empurrou com tanta força que terminou caindo no chão, zonza. O piso da cozinha apresentava pegadas de terra, passo por passo, indo em direção à sala escura. Lentamente, Valentina se levantou. Ainda não sabia do que se tratava. Um ladrão? Brincadeiras de mau gosto? A única coisa que Valentina tinha certeza era de que estava odiando tudo aquilo.
          Devagar e respirando fundo, Valentina caminhou até a sala, temerosa do que iria encontrar. O ambiente estava escuro, mas pelo canto do olho percebeu uma sombra se mexendo próxima à janela. Os trêmulos dedos dela encontraram o interruptor e Valentina acendeu a luz. E então ela gritou.
          Um homem sujo de terra e com um ferimento na cabeça a encarava sem dizer uma única palavra. Ele era alto e seus olhos, arregalados. O que era aquilo? Um zumbi?
- O que você quer, seu monstro? - berrou ela, em pânico.
- Você - respondeu ele, com a voz surpreendentemente clara.
        A coisa se jogou com uma rapidez impressionante por sobre Valentina, que bateu a cabeça no chão. Ela ficou tonta, mas mesmo assim bateu fortemente no peito dele com os punhos cerrados. O mesmo cheiro que tomava conta da casa agora voltou mais forte e vinha do monstro. Cheiro de coisa morta, pensou ela, debatendo-se.
         Valentina nunca pensou que a coisa pudesse ser tão forte. Por mais que lutasse, era quase impossível se mexer debaixo daquele corpo fedido. O cheiro que emanava dele a sufocava, fazendo que tossisse até seus pulmões parecerem que iam explodir. Por fim, Valentina soltou seu último suspiro. O zumbi venceu.
          A vizinhança só deu falta dela uns dois dias depois e isto porque a dona da casa queria o dinheiro do aluguel. Um vizinho fortão arrombou a casa, mas ali dentro só havia um cheiro... cheiro de podre, terra, morte. De Valentina, nem sinal.
     Dias mais tarde, alguns meninos da vila que jogavam futebol no campinho voltaram para casa mais cedo, apavorados. Juraram que viram um casal de zumbis vindo na direção deles, de olhos arregalados e as roupas esfarrapadas. Ninguém acreditou na história e os adultos disseram que era invencionice deles. 
      Um mês depois não havia mais ninguém morando na vila. As casas estavam vazias e fedor impregnava pelas ruelas. Os zumbis estavam prontos para atacar a cidade.
          Mas esta já é uma outra história.

sábado, 29 de outubro de 2011

Amores, 

Há muito tempo eu escrevo longos e longos romances que tem sido, injustamente - segundo minha opinião - relegados a ficar muito bem guardadinhos no meu pen drive. E eu escrevo muito! Amor, ódio, obsessão, encanto. Vidas e vidas passam pelas teclas do meu notebook e agora chegou o momento de compartilhar todas elas com vocês. O meu primeiro romance se chama Um Amor do Passado. Convido você a conhecer Camila/Diana e Caio. O passado e o futuro se misturam em uma doce e triste história de amor.