terça-feira, 31 de julho de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 38)


Na volta para casa ocorreu outro imprevisto. Seria sempre assim dali para frente. No meio de uma conversa comentei sem querer que fazia algum tempo que eu não visitava meus pais. Arrependi-me imediatamente. Nando, gentilmente, ofereceu-se:
- Se você quiser, eu posso levá-la em um final de semana até a casa deles. Assim eu posso conhecer meus sogros.
Eu gelei inteira.
- Ah… quem sabe... se você não tiver nada melhor para fazer…
- É só você pedir – respondeu o Nando, a coisa mais querida, segurando minha mão – Puxa, suas mãos estão geladas. Quer que eu desligue o ar?
- Quero – eu disse sentindo uma leve enxaqueca.
Ele desligou o ar condicionado e eu abri a janela. E o resto da viagem foi assim. Eu curtindo uma enxaqueca, com o vento direto no meu rosto para dar algum alivio. Felizmente meu namorado não fez mais nenhuma pergunta sobre a minha (nossa) família. Eu teria vomitado ali mesmo.


Quando eu cheguei em casa a enxaqueca continuava a mesma. Apesar do convite do Nando, resolvi dormir no meu apartamento para enfrentar a fúria da Rafa de uma vez por todas. No entanto, milagrosamente, ela não falou nada. Somente perguntou como havia sido o feriadão e eu perguntei por Guto. Conversamos mais algumas coisas e eu fui dormir exausta. Nem me lembrei de perguntar como estavam nossos pais.
Na manhã do dia seguinte a dor havia passado e eu me levantei sem muita vontade de ir para o estágio. A Rafa já tinha saído e eu tomei um copo de suco rapidamente, pois já estava atrasada. Cheguei uns quinze minutos depois do horário e para minha surpresa fui comunicada que estava sendo dispensada. A explicação foi de que eu sumi na semana do carnaval e não fui capaz de dar nenhuma satisfação, ou seja, deixei meus colegas empenhados. Como eu não tinha o que argumentar, peguei algumas coisas que estavam na minha gaveta e fui embora.
Resolvi voltar a pé para casa, tentando pôr meus pensamentos em ordem. Eu não podia me dar ao luxo de entrar em desespero, mas era exatamente isso o que estava acontecendo. Eu tinha contas para pagar. Rachava todas as despesas de luz, água, comida e qualquer coisa extra com a minha irmã. Meus pais mandavam algum dinheiro para nós todos os meses, mas era apenas um reforço para o aluguel. Minha bolsa de estágio era pouca, mas ajudava a também pagar minhas roupas, a passagem do ônibus, enfim, eu estava falida. A Rafa iria me matar. Meus pais também. E ainda havia o Nando. O que eu diria para ele? Estava morrendo de vergonha.
Meu celular tocou e eu levei um susto. Era Rafaela. Decidi que só contaria que eu estava na rua da amargura logo mais à noite, em casa.
- Oi, Rafa – tentei fazer a voz mais serena possível.
- O que você fez? – vociferou ela do outro lado da linha – O que você andou aprontando para eles te botarem para a rua?
Fiquei pálida. Ela já sabia.
- Como... como você descobriu que eu…
- Eu queria falar com você e liguei para lá. Puxa, Pauline! O que você tem na cabeça? O que nós vamos fazer agora?
- Vamos conversar de noite, está bem? – pedi querendo apaziguar – Estou atravessando uma avenida, não vou discutir este assunto com você agora. Ah, e ainda não conte nada para nossos pais.
- Até mais então – ela disse secamente, desligando o telefone em seguida.
Desconsolada, fui para casa e desliguei o celular. Embora quisesse falar com Nando, eu não estava preparada para contar a ele sobre minha nova realidade. Comparei-me a Raquel. Ela era uma publicitária de sucesso. Eu, uma ninguém desempregada. Namorando um cara bem sucedido, eu também deveria estar à altura dele. Deveria. O Nando trabalhava em um grande banco. E eu, uma pobretona que não tinha nem grana para pagar as contas. Qual futuro teria um namoro daqueles? Logo ele passaria a ter vergonha de mim.


sexta-feira, 27 de julho de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 37)


Os dias que passamos na serra foram encantadores, como não poderiam deixar de ser. A cidadezinha era bucólica, o hotel muito aconchegante. A gente não tinha nada para fazer, mas também isso não importava. Conhecemos todos os lugares turísticos e não-turísticos dos arredores e nunca tirei tanta foto na minha vida. Pena que eu não podia mostrar a foto do Nando para ninguém temendo que ele fosse reconhecido. E eu esperava que ele fizesse o mesmo. Passamos momentos maravilhosos sem imaginar que o meu tormento começaria a partir da minha volta, quando tudo iria degringolar vertiginosamente. Quando chegou a quarta-feira resolvi ligar para minha irmã e comunicar que só voltaria no próximo domingo. Evidentemente levei um sermão. Irresponsável foi a palavra que mais escutei. Pedi que ela não contasse para mamãe minhas intenções e desliguei o celular antes que eu ouvisse mais e mais xingamentos.
O pior aconteceu um pouco antes de irmos embora, ainda no hotel. Nando começou a falar sobre meus tios e primos, nem lembro como o assunto começou. Eu estava arrumando minhas coisas, escutando o que ele dizia, ligeiramente tensa que a conversa rumasse para algum terreno perigoso. Fui até o banheiro pegar minha escova de cabelo quando o Nando perguntou lá do quarto:
- Quais os nomes dos seus pais?
Fiquei imediatamente branca. Será que estava desconfiado de alguma coisa? Aparentemente não, a não ser que ele fosse um ótimo ator. Meu rosto, no espelho, refletia todo o meu pânico. E agora?
- Por quê? – perguntei tentando ganhar tempo, as mãos tremendo. Comecei a pentear o cabelo, mesmo estando bem penteada. Eu não queria voltar para o quarto e olhar para o rosto dele.
- Porque eu quero saber, ora essa.
De repente ele estava na porta do banheiro. Permanecemos nos olhando por alguns segundos. Nando esperava alguma resposta e eu pensava no que dizer. Droga, eu teria que mentir e esconder minha carteira de identidade depois em algum lugar bem secreto.
- Isis e Heitor.
- Isis é um nome bonito – elogiou ele.
            Os nomes inventados não tinham nada a ver com os nomes reais. De maneira alguma eu poderia esquecê-los. Meu Deus.
- Você está pronta?
Terminei de me pentear e respondi, sentindo meu coração disparar de medo e remorso:
- Sim.
- Então vamos… Temos um longo caminho pela frente.
Eu também esperava que nós dois tivéssemos um longo caminho para percorrermos juntos.



sábado, 21 de julho de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 36)


Saltei da cama angustiada. Eu sabia que o motivo para aquela saída antecipada só podia ser eu.
− Eu fiz alguma coisa?
Ele me encarou rapidamente.
− Não.
As respostas curtas me deixavam nervosa. Ele estava quase no fim.
− Posso ajudar você?
− Não se preocupe com nada. Suas coisas já estão prontas. Se você quiser tomar banho, vá logo.
Corri para o banheiro e tomei uma ducha de três minutos. Quando saí encontrei tudo pronto. Joguei a toalha na cama e o olhei tensa.
− Quer comer alguma coisa ainda?
Certamente a resposta que o Nando gostaria de escutar era um “não”.
− Não.
− Certo. Comemos qualquer coisa no caminho.
Reparei que ele vestia a mesma roupa da noite passada quando pegou as minhas mochilas e as poucas coisas que havia trazido.
− Você dormiu, Fernando?
− Ainda não. Por quê?
− Vai aguentar dirigir?
− Claro que sim – Nando respondeu sorrindo pela primeira vez – Ei! Não faça esta cara de susto.
− Não estou assustada – mas minhas palavras tremeram no final desmentindo-me.
− Escute, você não tem nada a ver com isto tudo, entendeu? Eu conto para você depois.
Resolvi ficar quieta. Descemos as escadas e encontramos Sérgio lá embaixo. Acho que nós éramos as únicas pessoas acordadas àquela hora, quase nove horas da manhã.
−Oi, Pauline – cumprimentou ele sem o seu costumeiro sorriso.
− Oi – respondi sem jeito.
Meio sem graça, Sérgio abriu a porta da caminhonete para que eu entrasse. Nando e ele se despediram acaloradamente e em seguida meu namorado entrou no carro, ligando o motor. Confesso que fiquei aliviada quando deixamos a casa e as monstras para trás, chegando mesmo a suspirar. Esperei que o Nando falasse alguma coisa, mas ele permanecia mudo. Somente quando chegamos na estrada é que ele disse, finalmente:
− Desculpe, Pauline.
Fiquei sem saber o que dizer. Talvez fosse eu quem tivesse que pedir desculpas. Tinha a nítida sensação de tudo o que estava acontecendo era por minha culpa. Por fim, criei coragem e o encarei antes de perguntar:
− Desculpas pelo quê?
− Por tudo.
− Por tudo o quê?
Foi a vez de ele ficar em silêncio.
− Por eu ter trazido você para cá. Acho que fui insensível... As meninas são amigas da Raquel. Eu jamais iria imaginar que elas lhe tratariam daquele jeito.
− Mas eu não estou zangada com você – retruquei – Você não tem culpa se elas se comportaram como crianças. Não precisava ter abandonado a casa daquele jeito. Eu…
− A Raquel está vindo para cá – esclareceu Nando deixando-me surpresa – Aquelas loucas ligaram ontem para ela dizendo que eu estava na praia, de namorada nova.
− Como você soube? – Não preciso dizer que eu estava cada vez mais chocada com o comportamento daquelas vacas loucas.
− Pelo Sérgio. Ele escutou a conversa – meu namorado fez uma pausa e continuou – Raquel está transtornada desde que rompemos. Não sei do que ela seria capaz de fazer se nos visse juntos.
Respirei fundo. Simplesmente as amigas do Nando tinham acabado com a nossa praia. A vantagem é que estávamos bem longe delas. Parecendo que lera meus pensamentos, Nando disse firmemente:
− Não vou deixar que tudo isso arrase o nosso feriadão.
− É mesmo? – perguntei curiosa – O que você sugere, então?
− Você já conhece a serra catarinense?
− Claro que não. Por quê? É para lá que você pretende me levar?
− Levar? Não. Eu vou sequestrar você.
Eu ri de pura satisfação. Inclinei-me para beijá-lo e então Nando me repreendeu, brincando:
− Você vai fazer com que eu perca o controle do carro. E do resto também.
Agora sim as coisas estavam entrando nos eixos. Finalmente ficaria sozinha com ele, em algum lugar com certeza bem aconchegante. Meu feriadão estava recém começando.
− Você alguma vez já passou o carnaval na serra? – perguntei.
Nando me encarou com um sorriso nos lábios, malicioso.
− Nunca. Sempre fui para a praia surfar.
− E será que você vai suportar ficar longe das ondas?
− Claro que sim. É você quem está comigo.
Fiquei toda arrepiada. Nossa! Os próximos dias prometiam ser de muita felicidade, desde que eu conseguisse despistar minha verdadeira identidade.
− Assim você me deixa convencida. A modéstia vai começar a passar longe daqui.
− Só tem uma coisa...
− O que é?
− Eu estou lhe sequestrando. E isto significa que você está sob o meu poder.
− Tenho direito a resgate?
− Evidente que não. E não me interrompa. Você vai ficar o resto da semana aqui comigo.
− Nando! Você está falando sério? Eu tenho que trabalhar na quarta-feira de cinzas!
− Problema do seu chefe.
− Nando – eu não sabia se me preocupava com o fato de faltar ao estágio ou se ficava feliz – eu não avisei que…
− Pauline, você odeia o seu curso. Você odeia o que faz. Não se boicote, seja feliz.
Seja feliz. Adorei escutar Nando dizer isso. Eu nunca havia sido tão feliz desde que o conhecera.
− Sou feliz. Agora eu sou feliz – eu disse explodindo de tanto amor.
Beijei-o novamente já esquecida daqueles dois dias passados na praia. Nada mais me importava. Esqueci minha família, meu estágio, o resto. Meu mundo era o Nando e eu não precisava de mais nada.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 35)


Eu e o Nando saímos da praia em seguida e os outros ficaram por lá mesmo. Já eram quase duas horas da tarde e fomos direto comer alguma coisa. O sol havia me deixado cansada, o mesmo acontecendo com meu namorado. Passamos, por fim, o resto da tarde descansando na casa, abraçados na cama, falando besteira ou tirando um cochilo. Ainda bem que ele não perguntou nada sobre mim, família ou sobre meu passado. Talvez estivesse satisfeito com o que já conhecia e eu esperava ardentemente que a sua curiosidade houvesse passado.
Ouvimos sons de vozes na casa, mas nenhum de nós dois sentimos a menor vontade de descer. Acho que o Nando também ficou chateado com o comportamento das suas amigas e estava tentando evitar um maior contato. Porém, em determinada hora, o celular dele tocou. Gilberto queria combinar a saída de mais tarde. Ficou acertado que nos encontraríamos no centro, depois das onze horas da noite, com outros amigos deles. Logo eu que detestava sair, zoeira e tudo o que lembrasse bebedeira, som alto e gente louca. Descobri que amor era isso mesmo. Eu só precisava cuidar para não me anular tanto.
Foi no nosso primeiro carnaval que descobri que meu namorado era uma pessoa muito popular. Não sabia se era bom ou ruim. No centro, no meio da bagunça toda, Nando era parado a todo instante. Acho que todos os amigos dele foram para Florianópolis curtir o carnaval. O fato de eu ser a nova namorada do Nando fazia as pessoas arregalarem os olhos. Muitos desconheciam que ele não estava mais com a Raquel. Continuei me sentindo uma alienígena, a intrusa. Eu às vezes parava e ficava observando aquelas pessoas, tentando compreender porque éramos todos tão diferentes, com valores tão opostos e pensamentos tão desiguais. Muitos dos amigos do Nando eram tão superficiais que eu me surpreendia como ele poderia ter algum tipo de amizade com aquelas pessoas. Enfim, o que me bastava era que meu namorado continuasse daquele jeito que me encantava e o resto que se danasse.
Eu que já estava dando pulos de alegria por não ter mais visto as três vacas, deparei-me com elas em plena rua, fingindo que sabiam sambar. Quando a Tati me viu, chamou a atenção das outras. Virei o rosto para o outro lado, tentando esquecê-las e me divertir um pouco. O Nando não as viu. Agarrado em uma latinha de cerveja, ele se divertia para valer. Eu bem que tentava. Em dado momento, sem querer, olhei na direção delas. Achei estranha a cena. Sandrinha estava no celular e as outras duas em volta. Depois Karine estendeu a mão e pegou o aparelho, com Tati fazendo a mesma coisa depois. De repente, Sandrinha reparou que eu estava observando tudo. Com um sinal, chamou as amigas e elas saíram do meu campo de visão. Nesse momento Nando me segurou pela cintura e cismou de tentar me ensinar a dançar pagode. Esqueci delas e a madrugada entrou com Nando fazendo força para que eu descontraísse. Chegamos em casa às quatro horas da manhã. Eu estava demolida, meus pés doíam e a única coisa que eu precisava era de uma cama. Será que todas as noites seriam iguais àquela? Será que o Nando agüentaria aquele ritmo até o final?
Como na outra noite, eu dormi assim que deitei a cabeça na cama, de roupa e tudo. Não vi o que o Nando estava fazendo e nem sei quando ele resolveu ir dormir. Tive um pesadelo horrível. Eu sonhava que estava me afogando, que pedia socorro para o Nando e ele não vinha me salvar. A água me encobria, eu submergia, depois conseguia voltar, o ar rareando. De longe, na areia, ele assistia minha morte iminente, com um rosto terrível, sem esboçar qualquer ajuda. Minha voz já não saía, eu sabia que estava morrendo…
Então acordei no mesmo momento em que o Nando me chamava. Achei que ele estava vindo me salvar enquanto eu me sentava na cama, ligeiramente estonteada, tentando voltar à realidade. Meu namorado ia de um lado para o outro, arrumando as coisas para ir embora. Minhas duas mochilas estavam em cima da penteadeira, aparentemente prontas. Pisquei os olhos e perguntei espantada:
− Nando… o que você está fazendo?
− Estou arrumando as nossas coisas – explicou ele sem me olhar, com uma voz estranha.
Fiquei muda, a princípio.
− Por quê? – perguntei depois de um minuto inteiro em silêncio, chocada com o ritmo frenético dele.
− Depois eu explico.


terça-feira, 10 de julho de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 34)


Foi uma droga desde que coloquei os pés na areia. A impressão que tive é que fomos seguidos, o que não era verdade, claro. Os amigos do Nando e suas respectivas namoradas apareceram vindos não sei de onde, com um jet ski à reboque. Vi que os olhos do meu amor brilharam quando se depararam com o jet ski e previ que certamente eu teria que dividir minha atenção com aquele trambolho. Os rapazes, todos muito gentis, armaram uma tenda para que nós todas nos protegêssemos do sol. Eu não tinha a menor intenção de ficar próxima a elas, mas não havia alternativa para mim. Minha pele sempre foi muito clara, ao contrário das outras que estavam super bronzeadas e concorrendo entre si para quem adquiriria um câncer de pele primeiro.
Aproximei-me do Nando que estava à beira mar, preparando o jet ski. Eles sairiam para dar uma volta, mas meu namorado me prometeu:
- No máximo em meia hora eu retorno. Você acha que consegue ficar sozinha com elas?
A pergunta foi feita em tom de sussurro. Na verdade eu não tinha a menor vontade de ficar com as vacas. Só de ver o Nando prestes a sair já foi motivo para meu estômago doer, mas eu não podia obrigá-lo a ficar comigo o tempo todo. Respondi, demonstrando muita calma:
- Claro que sim. Vá tranqüilo.
Ele me beijou e eu fiquei ali pertinho, assistindo aos meninos saírem. Depois que eles partiram, eu me dirigi lentamente à tenda. Surpresa. As três vacas haviam tomado o espaço, não sobrando uma mísera sombrinha para mim. E o sol estava cada vez mais forte. Fiz de conta que não me importava. Peguei minha sacola de praia, tirei minha toalha de dentro e passei um protetor solar fator 50, sempre sabendo que todos meus movimentos eram atentamente acompanhados por elas. Uma senhora que estava próxima a mim se ofereceu para passar o protetor nas minhas costas, o que me tranqüilizou bastante, pois eu já estava temendo outra insolação. Então, achando-me protegida do sol, deitei na toalha, fechei os olhos e passei a escutar a conversa enjoada das amiguinhas da Raquel.
Elas sabiam que eu estava escutando tudo, apesar de nem me mexer. A conversa girava sobre ela, a Raquel. Para me provocar em seguida começaram a falar no Nando também, do tempo em que ele estava noivo da outra. Deram a entender que o relacionamento era perfeito e que a separação não seria para sempre. Comecei a me incomodar quando escutei isso, porém permaneci totalmente impassível, de olhos fechados. A seguir veio um relato de quando Raquel caiu de jet ski e Nando a salvou, heroicamente, arrancando aplausos de quem assistiu a cena. Morri de raiva.
A meia hora do Nando levou muito mais tempo. Além de eu estar com fome, indignada e com calor, não suportava mais o matraquear das gralhas. O nome de Raquel eu já havia escutado mais de cem vezes e só não voltei a pé para casa porque não sabia o caminho. De repente ouvi vozes conhecidas e entre elas identifiquei a do Nando. Nem acreditei. Dei um salto da toalha e fui até ele aliviada. Esperava que agora ele me desse um pouco de atenção e me tirasse de perto delas.
- E então? – ele me perguntou com o rosto queimado do sol – Demorei muito, não é?
- Não. Nem me dei conta – menti descaradamente.
Neste momento Nando olhou para a tenda e reparou que Karine, Tati e Sandrinha tinham ocupado todo o espaço debaixo dela.
- Espere aí! Você não ficou debaixo da tenda que armamos para vocês?
- Não.
Foi a única coisa que consegui responder, pois um bolo se formou na minha garganta. Não, eu não iria chorar ali na frente de todo mundo. Jamais daria esse prazer a elas.
- Puxa, você está quente – ele disse encostando a mão na minha pele – Vamos nos refrescar um pouco no mar.
Apesar das ondas fortes, nem senti tanto medo assim. Preferia enfrentar o mar a ficar ao lado das monstras. E nunca me diverti tanto. O mar era tão azul que eu enxergava meus pés. Elas ficaram na areia e deixaram a proteção da tenda quando viram que eu não voltaria mais para lá. Depois de algum tempo, quando estávamos mais perto do raso, o Nando resolveu perguntar:
- Elas incomodaram muito você?
Felizmente minha vontade de chorar já tinha passado. Consegui responder sem tremer a voz:
- Falaram o tempo todo na Raquel.
A expressão dele se crispou. Continuei:
- Chegaram mesmo a relatar aquela vez que ela caiu do jet ski e você a salvou.
- Como?
- Você a salvou de se afogar e até as pessoas que estavam na areia o aplaudiram. Lembra?
- Não posso lembrar-me de algo que nunca aconteceu – retrucou Nando, alterado – Essas mulheres estão loucas! Eu nunca salvei Raquel de afogamento nenhum. Ela detestava praia, mar, areia. Nos últimos tempos eu sempre vinha sozinho para o litoral.
Cheguei a ficar arrepiada. Elas estavam realmente a fim de perturbar meu relacionamento com o Nando. E não estávamos nem na metade do feriadão ainda. O que mais podia ainda acontecer?

quarta-feira, 4 de julho de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 33)


Acordei pontualmente às nove horas da manhã com o sol entrando pela janela. O Nando, ao meu lado, parecia dormir profundamente. Ligeiramente tonta, levantei-me e fui tomar um banho bem frio. E quando retornei encontrei meu lindo namorado, de olhos semicerrados, rolando pela cama.
Ele murmurou:
− Pensei que você tivesse  ido para a praia sozinha.
Atirei-me ao lado dele e beijei todo o seu rosto.
− Já curou sua bebedeira?
− Nem fiquei tão bêbado assim.
− Realmente, no reveillon você estava bem pior.
− Você também estava meio alta ontem. Eu percebi.
− Foi a melhor maneira que achei para enfrentar as amigas da sua ex-noiva.
− Não ligue para elas – Nando pediu, bocejando, para depois declarar – Estou com vontade de tomar um suco.
Prontamente me ofereci:
− Quer que eu faça um para você?
− Eu quero – respondeu ele sem rodeios – Enquanto você desce, eu tomo um banho. O que você acha?
− Acho que tudo bem.
Louca para agradar meu amor, coloquei meu biquíni e desci, achando que todos estavam dormindo, curando a ressaca. Enganei-me redondamente. Quando entrei na cozinha, dei de cara com Karine e Tati que imediatamente interromperam a conversa quando me viram. Fingi que não estava nem aí para elas e alegremente dei um sonoro “bom dia”. Elas mal responderam recomeçando a conversa aos poucos.
Como nenhuma fez questão de me ajudar, tive um pouco de dificuldade em achar o liquidificador para fazer o suco. Eu sabia que elas acompanhavam cada passo meu e minha maior preocupação era não fazer nenhuma burrada. Tentando manter a calma, cortei várias fatias de melancia, preparei sanduíches para mim e para o Nando, enquanto escutava o papinho superficial delas. Várias vezes as duas mencionaram o nome da Raquel, em tom mais alto, só para que eu escutasse. Fiquei furiosa. Depois, para completar o quadro, chegou a tal da Sandrinha, para mim a pior de todas as três. Esta não fez a menor questão de me cumprimentar e eu nem olhei para trás para tentar bancar a simpática.
Com a chegada da Sandrinha, elas se transformaram em umas gralhas ridículas. A palavra mais falada era “Raquel”. A Raquel era linda, poderosa, moderna, enfim, uma mulher de sucesso. Eu queria esganar todas elas. Coloquei os pedaços de melancia no liquidificador e o liguei. Para minha satisfação, o aparelho era um pouco antigo e fazia um barulho ensurdecedor, abafando a voz delas e irritando-as profundamente. De propósito deixei-o ligado mais tempo, em um ponto que nem mesmo eu mais suportava. Quando finalmente eu decidi desligá-lo, o silêncio voltou à cozinha e as três encaravam-me furiosas. Esperei ansiosamente que elas dissessem alguma coisa, pois eu já estava pronta para a reação. Mas o silêncio permaneceu, infelizmente, e sem olhar para Sandrinha, Karine e Tati, peguei a jarra do liquidificador e os sanduíches e subi para paparicar meu amor.
Encontrei-o enrolado em uma toalha, já de banho tomado. Assim que ele me viu, abriu um sorriso e me elogiou:
− Puxa, que eficiência...
Contente com o elogio, eu respondi:
− Fiz um suco de melancia. Lembrei que você disse uma vez que gostava.
− Adoro. Deu para ouvir o liquidificador daqui.
Contei para ele, então, o que havia se passado lá embaixo e o motivo de eu haver infernizado todo o litoral com o aparelho. Nando escutou sério, bebericando o suco, sem dizer nada o tempo todo. Quando eu acabei o relato, ele disse:
− Vou tentar ficar sempre com você quando elas estiverem por perto. Mas se você se sentir ofendida, reaja. Não engula nenhum desaforo delas.
− Não sou muito de reagir… mas não sei se conseguirei ficar quieta por muito tempo.
− Não vou deixar nosso carnaval ser um inferno. Prometo.
Eu sabia que ele falava sério. Terminamos de comer em cima da cama, em clima de romance. Depois, aproveitando que o sol estava quente, fomos direto para a praia.