Gentilmente,
ele disse:
−
Vou levar você até a clínica de um amigo meu, está bem? É melhor ver seu pulso.
Acho que está quebrado.
Balbuciei
alguma coisa, só enxergando lágrimas na minha frente.
−
Depois, se você quiser, eu posso levá-la até uma delegacia de polícia para
prestar queixa contra meu irmão.
Consegui
falar, aos trancos e barrancos:
−
Eu só fiquei com ele… este tempo todo por que… eu o amava… Porque eu o amo.
Funguei
limpando meus lábios machucados com a manga do casaco.
−
Ele tem razão… em se ressentir comigo. Mas por que Nando me bateu? Por quê? Ele
estava disposto a… a me matar.
Ter
apanhado do homem a quem eu daria minha vida era algo inaceitável para mim.
Nando estava tão surtado que poderia bem ter me matado. Aquilo tinha sido a pá
de cal. Minha vida com ele havia sido reduzida a uma surra covarde.
−
Ele bateu em você daquele jeito porque a ama.
−
Se ele me amasse – solucei – não teria encostado o dedo em mim.
−
Paulinha, você já ouviu alguma vez aquela frase “quem ama não mata”? Pois bem,
quem ama pode matar sim.
Que
ironia do destino eu ficar tanto tempo procurando pelo Nando e ainda ser morta
por ele... Andamos em silêncio por algum tempo e eu sentia que minha vida havia
passado por um terremoto da mais alta magnitude. Agradeci aos céus por meu
primo estar me ajudando e quando estávamos próximos da clínica ele perguntou:
−
Você quer chamar alguém?
−
Minha irmã – balbuciei.
−
Rafaela? Dê-me o número dela.
Ele
próprio fez a ligação e eu pude escutar os berros assustados da minha irmã do
outro lado. Quando chegamos à clínica fui direto para uma sala de exames. Meu
pulso não chegava a estar quebrado, mas a dor era grande. Uma hora depois, com
meu braço engessado, deparei-me com Rafa e Ricardo na recepção, conversando
animadamente. Pareciam velhos amigos. Assim que me viu, Rafaela veio correndo
ao meu encontro e me abraçou.
−
Puxa, mas que barraco, hein? – murmurou ela.
Nem
respondi, abalada. Meu primo se aproximou e perguntou:
−
Tudo bem? Posso levar vocês para casa.
Rafa
respondeu:
−
O Guto está de carro.
Olhei
para meu primo e disse:
−
Muito obrigada pela sua ajuda. Eu não teria conseguido sair de lá senão fosse
você.
−
Não se preocupe – sorriu ele e com uma dor no coração, constatei que o sorriso
dele era igual ao do Nando – Esqueça.
Fizeram-se
alguns segundos de silêncio e então ele comentou:
−
Apesar das circunstâncias, foi bom ter visto vocês novamente.
−
É verdade – concordou minha irmã – Lamento mesmo que tenha sido desta forma
tão… tão triste.
−
Bem, tenho que ir agora acalmar os ânimos do lado de lá – retrucou Ricardo
sorrindo de novo – Cuide-se, Paulinha.
Ele
se virou e começou a se afastar. Não me contive e o chamei:
−
Ricardo!
Meu
primo voltou-se para nós outra vez e como eu já não tinha nada mais a perder,
perguntei:
−
Naquela noite, lá no Caribbean…
−
Sim – confirmou Ricardo – Eu soube que era você no primeiro segundo.
Fiquei
estática. Nando tinha sido o único da família – sem contar Maurício que mal me
conheceu – que não foi capaz de me reconhecer. Só uma explicação astral para esclarecer
isto.
Quando
entramos no carro Rafaela desabafou:
−
Este seu ex-namorado é mesmo um panaca. Só ele não descobriu que você é você.
−
De certo modo estou um pouco aliviada – sussurrei.
−
Agora é tocar para frente – falou Guto tentando me dar um apoio moral.
−
Mas parece também que vou explodir.
Rafaela,
que ía sentada no banco da frente, olhou para trás com uma expressão
preocupada:
−
Vamos virar a página, Paulinha? Sua aventura acabou. Este Fernando não merece
você. Olhe o que ele lhe causou.
−
Eu devia ter contado desde o início.
−
Mas não contou e as coisas acabaram assim. Você procurou este desfecho. Escreva
outra história para sua vida, Pauline.
Era
muito fácil falar. Ainda no carro tentaram me dar um remédio para a dor, mas eu
não quis tomar. Eu queria sentir dor, a dor física. Precisava urgentemente que
alguma coisa suplantasse a dor que eu trazia no coração e que, naquele momento,
parecia que iria durar para sempre.
Chegamos
em casa e eu me enfiei no quarto. Antes implorei para que Rafa não comentasse
nada com nossos pais. Seria mais um motivo de estresse. Deitei-me na cama
devastada. O dia tinha chegado. O dia da verdade. Nunca imaginei que eu levaria
uma surra. Pensei mil coisas. Gritos, berros, separação. Mas surra? Nunca. Ele
bem que poderia ter me matado tamanha a raiva que sentia de mim.
Comecei
a chorar abraçada no meu travesseiro. A raiva dele era ódio, ódio puro. Nando
me odiava tanto a ponto de me bater. Me acusou de coisas horríveis. E a dor era
pior porque certamente jamais voltaríamos a ficar juntos novamente. Eu tinha
sido comparada ao meu pai e na concepção do Nando, ele era o próprio diabo.
Só
fui comer alguma coisa quando anoiteceu. Aquela altura eu já havia traçado
alguns planos. Empurrei um sanduíche goela abaixo, pensando nos meus próximos
passos. Meu pulso doía e aquilo não era nada perto do que eu sentia. Mesmo
assim eu não parava de pensar nele e no tamanho do ódio que Nando sentia por
mim. Eu jamais poderia conviver com aquilo, eu não aceitava o que tinha me
acontecido. Não poderia suportar um dia cruzar com o Nando e me deparar com o
ódio no seu olhar. Meu coração sangrava. Eu não queria mais ficar no
apartamento, na cidade, no mundo inteiro. Rezei para ser abduzida e ir de disco
voador para um sistema solar bem longe do nosso.
Como
minhas preces não foram atendidas e eu não fui abduzida, só me restou juntar
algumas poucas peças de roupa, um dinheiro que eu tinha juntado e sair, fugida,
de madrugada. Fui para a rodoviária. Meus olhos estavam secos e ardidos de
tanto chorar. Entrei em um ônibus que ía para o Nordeste, lugar onde eu nunca
havia estado até então. Entretanto, eu não tinha medo de mais nada. O pior já
acontecera. Eu estava prestes a me aventurar em um mundo novo, na desesperada
tentativa de esquecer que Nando me odiava. Não preciso dizer que foi tudo em
vão. Eu não o esqueci. E meu sofrimento, mesmo com a distância, aumentava a
cada dia.
mais mais mais...... rapido
ResponderExcluirNovo capítulo no sábado!
ExcluirNossa... continuo fascinada pela história, e esperando ansiosamente cada capítulo. Sério!
ResponderExcluirGurias, obrigada pelos elogios. Vou tentar postar os capítulos finais com mais frequência.
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