quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 65)


Gentilmente, ele disse:
− Vou levar você até a clínica de um amigo meu, está bem? É melhor ver seu pulso. Acho que está quebrado.
Balbuciei alguma coisa, só enxergando lágrimas na minha frente.
− Depois, se você quiser, eu posso levá-la até uma delegacia de polícia para prestar queixa contra meu irmão.

Consegui falar, aos trancos e barrancos:
− Eu só fiquei com ele… este tempo todo por que… eu o amava… Porque eu o amo.
Funguei limpando meus lábios machucados com a manga do casaco.
− Ele tem razão… em se ressentir comigo. Mas por que Nando me bateu? Por quê? Ele estava disposto a… a me matar.

Ter apanhado do homem a quem eu daria minha vida era algo inaceitável para mim. Nando estava tão surtado que poderia bem ter me matado. Aquilo tinha sido a pá de cal. Minha vida com ele havia sido reduzida a uma surra covarde.
− Ele bateu em você daquele jeito porque a ama.
− Se ele me amasse – solucei – não teria encostado o dedo em mim.
− Paulinha, você já ouviu alguma vez aquela frase “quem ama não mata”? Pois bem, quem ama pode matar sim.

Que ironia do destino eu ficar tanto tempo procurando pelo Nando e ainda ser morta por ele... Andamos em silêncio por algum tempo e eu sentia que minha vida havia passado por um terremoto da mais alta magnitude. Agradeci aos céus por meu primo estar me ajudando e quando estávamos próximos da clínica ele perguntou:
− Você quer chamar alguém?
− Minha irmã – balbuciei.
− Rafaela? Dê-me o número dela.

Ele próprio fez a ligação e eu pude escutar os berros assustados da minha irmã do outro lado. Quando chegamos à clínica fui direto para uma sala de exames. Meu pulso não chegava a estar quebrado, mas a dor era grande. Uma hora depois, com meu braço engessado, deparei-me com Rafa e Ricardo na recepção, conversando animadamente. Pareciam velhos amigos. Assim que me viu, Rafaela veio correndo ao meu encontro e me abraçou.
− Puxa, mas que barraco, hein? – murmurou ela.
Nem respondi, abalada. Meu primo se aproximou e perguntou:
− Tudo bem? Posso levar vocês para casa.
Rafa respondeu:
− O Guto está de carro.
Olhei para meu primo e disse:
− Muito obrigada pela sua ajuda. Eu não teria conseguido sair de lá senão fosse você.
− Não se preocupe – sorriu ele e com uma dor no coração, constatei que o sorriso dele era igual ao do Nando – Esqueça.

Fizeram-se alguns segundos de silêncio e então ele comentou:
− Apesar das circunstâncias, foi bom ter visto vocês novamente.
− É verdade – concordou minha irmã – Lamento mesmo que tenha sido desta forma tão… tão triste.
− Bem, tenho que ir agora acalmar os ânimos do lado de lá – retrucou Ricardo sorrindo de novo – Cuide-se, Paulinha.
Ele se virou e começou a se afastar. Não me contive e o chamei:
− Ricardo!
Meu primo voltou-se para nós outra vez e como eu já não tinha nada mais a perder, perguntei:
− Naquela noite, lá no Caribbean…
− Sim – confirmou Ricardo – Eu soube que era você no primeiro segundo.

Fiquei estática. Nando tinha sido o único da família – sem contar Maurício que mal me conheceu – que não foi capaz de me reconhecer. Só uma explicação astral para esclarecer isto.
Quando entramos no carro Rafaela desabafou:
− Este seu ex-namorado é mesmo um panaca. Só ele não descobriu que você é você.
− De certo modo estou um pouco aliviada – sussurrei.
− Agora é tocar para frente – falou Guto tentando me dar um apoio moral.
− Mas parece também que vou explodir.

Rafaela, que ía sentada no banco da frente, olhou para trás com uma expressão preocupada:
− Vamos virar a página, Paulinha? Sua aventura acabou. Este Fernando não merece você. Olhe o que ele lhe causou.
− Eu devia ter contado desde o início.
− Mas não contou e as coisas acabaram assim. Você procurou este desfecho. Escreva outra história para sua vida, Pauline.
Era muito fácil falar. Ainda no carro tentaram me dar um remédio para a dor, mas eu não quis tomar. Eu queria sentir dor, a dor física. Precisava urgentemente que alguma coisa suplantasse a dor que eu trazia no coração e que, naquele momento, parecia que iria durar para sempre.

Chegamos em casa e eu me enfiei no quarto. Antes implorei para que Rafa não comentasse nada com nossos pais. Seria mais um motivo de estresse. Deitei-me na cama devastada. O dia tinha chegado. O dia da verdade. Nunca imaginei que eu levaria uma surra. Pensei mil coisas. Gritos, berros, separação. Mas surra? Nunca. Ele bem que poderia ter me matado tamanha a raiva que sentia de mim.

Comecei a chorar abraçada no meu travesseiro. A raiva dele era ódio, ódio puro. Nando me odiava tanto a ponto de me bater. Me acusou de coisas horríveis. E a dor era pior porque certamente jamais voltaríamos a ficar juntos novamente. Eu tinha sido comparada ao meu pai e na concepção do Nando, ele era o próprio diabo.

Só fui comer alguma coisa quando anoiteceu. Aquela altura eu já havia traçado alguns planos. Empurrei um sanduíche goela abaixo, pensando nos meus próximos passos. Meu pulso doía e aquilo não era nada perto do que eu sentia. Mesmo assim eu não parava de pensar nele e no tamanho do ódio que Nando sentia por mim. Eu jamais poderia conviver com aquilo, eu não aceitava o que tinha me acontecido. Não poderia suportar um dia cruzar com o Nando e me deparar com o ódio no seu olhar. Meu coração sangrava. Eu não queria mais ficar no apartamento, na cidade, no mundo inteiro. Rezei para ser abduzida e ir de disco voador para um sistema solar bem longe do nosso.

Como minhas preces não foram atendidas e eu não fui abduzida, só me restou juntar algumas poucas peças de roupa, um dinheiro que eu tinha juntado e sair, fugida, de madrugada. Fui para a rodoviária. Meus olhos estavam secos e ardidos de tanto chorar. Entrei em um ônibus que ía para o Nordeste, lugar onde eu nunca havia estado até então. Entretanto, eu não tinha medo de mais nada. O pior já acontecera. Eu estava prestes a me aventurar em um mundo novo, na desesperada tentativa de esquecer que Nando me odiava. Não preciso dizer que foi tudo em vão. Eu não o esqueci. E meu sofrimento, mesmo com a distância, aumentava a cada dia.



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