domingo, 18 de novembro de 2012

FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 61)


Minha relação com a Rafa deteriorou-se a olhos vistos. Ela já nem olhava mais para mim. O Nando ligava todos os dias, à noite, e eu jamais mencionei qualquer coisa. Aguentei sozinha toda aquela rejeição.

Partirmos na sexta-feira, antes de o sol nascer. O tempo já começava a esfriar e eu me desobriguei a levar meus biquínis. Estar ao lado do Nando era a mesma coisa que esquecer tudo o que me arrasava. E eu desejava que aqueles três dias durassem toda a eternidade.

A pousada ficava em uma praia pequena e pouco frequentada. Nosso quarto era muito aconchegante, perfeito para nós dois. À noite fomos obrigados a dormir de cobertor e me vi rezando para poder conseguir atravessar o próximo inverno com o Nando. Apesar de todo o esforço para esquecer meus problemas, existiam momentos que eles transpareciam nos meus olhos. Várias vezes percebi o olhar do Nando sobre mim, como se ele quisesse me decifrar. Era apavorante. Eu estaria em maus lençóis se ele pudesse ler todos os meus pensamentos.

A gota d’água veio no sábado ao entardecer. Passeávamos na beira da praia. Um ventinho frio era a desculpa para que andássemos agarradinhos um no outro. Nando aproveitou o momento e perguntou suavemente:
- O que aconteceu que está deixando você tão triste?
Imediatamente eu tive vontade de chorar para não fugir ao costume. Porém fui forte e engoli o choro ao responder:
− Nada.
− Não me enrole, Pauline. Me conte o que foi. Você não confia em mim?
− Não é isto – eu caminhava olhando para o chão, afim de que o Nando não reparasse na minha cara de choro – Não quero chatear você com coisas sem sentido.
− Se magoam você, então elas têm um sentido...
− Mas não para você.
− Pauline, pare de dar voltas. Quem magoou você?
Respirei fundo e revelei:
− Briguei com a minha irmã.
− De novo? Por quê?
− Porque ela é uma imbecil.
Ficamos em silêncio. Dei um tempo e prossegui:
− Briguei com o resto da família também.

Ele parou de caminhar e fez com que eu olhasse para o seu rosto.
− Gostaria que você me contasse este tipo de coisa.
A preocupação dele me comoveu mais.
− Não sou de me abrir muito.
− Eu sei, mas não posso ficar tranquilo sabendo que o mundo está desabando nas suas costas.
O esforço que eu fazia para não chorar era quase além das minhas possibilidades. E olhar para o Nando tornava tudo muito pior.
− E qual foi o motivo?
− O motivo sou eu estar aqui. Esqueci que minha mãe faz aniversário hoje. Deve estar acontecendo uma grande festa em homenagem a ela. Mas eu preferi estar aqui com você e eles não entendem isto.
− Por que não me disse? – Nando me repreendeu – Eu desmarcaria tudo.
− Nando, você não entendeu. Eu estou aqui com você porque eu escolhi assim. Não há outro lugar no mundo em que mais eu deseje estar.
Ele me beijou, suavemente. E foi um beijo tão doce que quase levitei.
− Você faz com que eu me sinta um homem abençoado.
Eu abracei-o longamente e perdi a noção de quanto tempo ficamos aninhados nos braços um do outro, nossos corações batiam sincronizados. Então ele sussurrou no meu ouvido:
− Eu sempre vou amar você.
Me enrosquei mais ainda no pescoço dele. Talvez naquele momento, de sintonia perfeita, fosse a hora exata para contar tudo e acabar com o sofrimento de uma vez por todas. Eu não podia perdê-lo. Jamais.
− Nando… - murmurei sem o soltar. Meu corpo tremia todo e meu coração disparou.
− O que foi?
Nando tornou a fazer com que eu o encarasse. Tentei abrir a boca para começar a contar o meu segredo, porém não consegui articular uma sílaba.
− O que é, Pauline? Você quer me contar alguma coisa?

Balancei a cabeça, afirmativamente. Sim, eu precisava dizer quem eu era, a prima distante, filha do ladrão que tentara destruir com a família dele e que vinha escondendo sua real identidade há quase quatro meses.
− Então me conte – pediu ele ternamente – Diga para mim o que destrói você por dentro.
Faltou-me coragem. Olhei para o rosto perfeito do meu amor e eu lembrei que sem ele minha vida nunca mais teria sentido algum. Comecei a chorar copiosamente, enroscada nos seus braços. Depois de uns dez minutos de choradeira total, as palavras voltaram a minha boca.
− Nando… tudo o que eu fiz… tudo o que eu faço…
Tive que interromper para me recompor outra vez.
−… é somente por amor. Todas minhas atitudes… tudo, absolutamente tudo, é porque eu amo você mais do que qualquer coisa. Jamais se esqueça disto… Um dia… bem, um dia isto pode fazer toda a diferença.
Consegui tocar fundo no coração dele e Nando me abraçou, emocionado também. Ficamos mais um tempão na beira da praia, até a noite se fechar sobre nós. Ali, sob as estrelas, eu tive certeza de que jamais o perderia.

Enganei-me redondamente.


Minha vida com Rafaela tornou-se irreal. Vivíamos no mesmo apartamento e mal nos falávamos. Algumas semanas antes de tudo acontecer, eu comecei a ver o Nando apenas nos finais de semana. Por conta do banco, ele passava os cinco dias úteis em São Paulo e eu quase morria de saudade. Contudo, quando meu namorado voltava, passávamos momentos maravilhosos. Secretamente eu torcia para que ele fosse transferido para a matriz que ficava justamente no centro do país. Na minha cabeça assim tudo estaria resolvido.

Se no meu trabalho as coisas corriam bem, o relacionamento com meus pais estava cada vez pior. Minha mãe não tinha engolido ainda o fato de eu não ter passado o aniversário com ela e, para piorar, minhas felicitações haviam sido por meio de uma mensagem através do celular. Calor humano zero. Nunca mais tive coragem de ligar para meus pais. A comunicação era feita por Rafaela que informava se eu estava bem ou não. Não sei também se eles tinham vontade de falar comigo. Alguém precisava cortar o gelo. E eu esperava que partisse do lado de lá.
O Nando pouco perguntava sobre minha família por saber que isto me machucava. Depois daquele episódio, na praia, quando quase confessei tudo, eu sempre tinha a impressão de que ele esperava que a qualquer minuto eu fosse revelar alguma coisa. Mas o momento tinha passado e a coragem – que era o mais importante – também. Eu me considerava a pessoa mais fraca do mundo. Um dia, a bomba iria explodir e eu não estava preparada para as consequências. E os estilhaços atingiriam muita gente.


2 comentários:

  1. Respostas
    1. Oi, Estela. Desculpe, não tenho tido tempo para postar os demais. Vai até o capítulo 72. Aguarde, em breve os outros virão com mais regularidade.

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