Há quanto tempo eu estava atrás dele? Muito tempo. Havia sido uma caçada solitária, muitas vezes dolorida, com um final que eu julgava imprevisível.
Ninguém podia sequer imaginar o tamanho da
minha obsessão. Ou amor. Ou seja lá o que fosse. Por vezes eu interrompi minha
caçada, por algum motivo superior a minha vontade. Para recomeçar logo em
seguida.
Essa caça era meu primo, filho do irmão do
meu pai. Fernando, este era o seu nome, com seis anos a mais que eu, nunca se
deu conta de que eu existia. Apaixonada por ele eu era desde que me conheço por
gente e assim vem sendo, desde então, por todos os meus 22 anos de vida.
Quando eu tinha aproximadamente oito anos de
idade, sofremos um duro golpe. Meu tio, pai do Nando, conseguiu deixar-nos na
miséria. Vendo-se falido e quase sem ter onde morar, meu pai juntou mamãe, eu e
minha irmã mais velha e fomos todos morar no interior, em uma pequena
cidadezinha da serra. Depois de muita luta, meu pai foi capaz de se reerguer,
porém perdoar o irmão, jamais. Mamãe chegou a ficar doente, depressiva, quando
seu nível de vida caiu drasticamente. Para mim e Rafaela também foi muito
complicado. Mas os anos passaram, conseguimos sair do buraco, enfim. No dia que
meu pai me deu um computador de presente de aniversário, eu já tinha traçado na
minha mente o que fazer.
Eu iria atrás do Fernando. Primeiro,
virtualmente.
Isso foi há uns três anos, um ano antes de eu
finalmente passar em uma universidade federal, onde para alívio dos meus pais,
o ensino era gratuito. Fui morar na capital, onde a Rafaela já estava instalada
fazia algum tempo. Não demorou muito, descobri o Nando no Facebook. Namorei
todas as fotos dele e tentei decifrar cada coisa que os amigos postavam no
mural. Ninguém nunca desconfiou da minha obsessão, da minha caçada desenfreada.
Por via das dúvidas, criei um Facebook falso. Porém, mesmo que não fizesse
isso, Fernando jamais saberia quem eu era. Da última vez que ele havia me
visto, eu estava bem magrinha, com um corte de cabelo curto e horroroso e com
aparelho nos dentes. Com o tempo meu cabelo felizmente cresceu, fiquei ruiva e
meus dentes não precisaram mais de artifícios para ficar bonitos. Meus ossos
também deixaram de ser tão visíveis.
Quando eu me mudei para o apartamento alugado
em que a Rafa já morava na capital, eu já sabia tudo da vida do Nando.
Inclusive que ele tinha uma namorada firme. Evidentemente
que isto não me desestimulou nem um pouco.
Minha irmã sempre foi mais festeira do que
eu. Era comum ela sair para dançar com as amigas, enquanto eu ficava no apartamento,
estudando. Algumas vezes, através do Facebook, eu descobria onde o Nando ía. E
ele frequentava os lugares que minha irmã não curtia. E sair sozinha à noite,
para ir atrás do meu primo, certamente não fazia parte dos meus planos de
conquista, pelo menos ainda. Apesar de todo o meu esforço, o local que ele
morava ainda era por mim ignorado. Só sabia que o Nando trabalhava em um grande
banco, na assessoria jurídica. Portanto, deduzi que o meu amado era advogado.
Eu sempre me pegava imaginando qual seria a minha reação quando eu finalmente
ficasse frente a frente com ele. Já fazia tanto tempo... Nas fotos ele
continuava o mesmo. O mesmo lindo, o mesmo fofo, o mesmo gato. Só torcia para
que ele não continuasse com a mesma antipatia que sentia por mim quando éramos
crianças.
O final do ano se aproximava e a Rafa não se
contentou em passar o reveillon na casa dos nossos pais. Ela e as amigas
inventaram de passar a virada na praia. Eu não quis. Não gostava de
amontoamento de gente, barulheira, bebida correndo solta. As gurias insistiram.
Recusei.
Numa das minhas investigações no Facebook do
Nando, tive uma surpresa que me deixou estarrecida. Céus! Ele iria comemorar o
novo ano na mesma praia que eu tinha me negado a ir!
Rafa e as outras já haviam desistido de mim
quando eu implorei para que me levassem também. Minha sorte é que uma das
meninas tinha desistido de ir, sobrando lugar. E lá fui eu, para a praia,
torcendo para que além da virada do ano, minha vida também virasse de ponta
cabeça. Eu já estava cansada de sonhar. Minha vida precisava de ação.
Foi o que eu tive.
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